07 julho 2009

Relatório da Operação Nêmesis "Tentáculos em Minas"

Julio Simões. . Relatório da Operação Nêmesis mostra que
Ligações sob suspeita
Interceptações telefônicas feitas pela polícia indicam esquema em Minas
EZEQUIEL FAGUNDES

Nos próximos dias, o Tribunal de Justiça da Bahia vai se manifestar sobre a Operação Nêmesis, investigação que, desde o ano passado, vinha sendo conduzida pela Coordenação de Operações Especiais da Polícia Civil e foi concluída pelo Ministério Público daquele Estado na última semana. Os trabalhos, que tinham o objetivo de apurar um esquema de fraude em licitação pública em Salvador, acabaram esbarrando em uma organização criminosa que, ao que tudo indica, possui tentáculos nos Estados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, além da Bahia.

O modo de operação da quadrilha é bem conhecido: pagamento de propina em troca de favorecimento em contratos superfaturados. Segundo o organograma elaborado pelo setor de inteligência da Polícia Civil da Bahia, o patrocinador da organização criminosa é Fernando Antônio Simões. Ele é um dos donos da empresa Julio Simões Transportes Ltda., principal alvo da ação policial.

Abaixo dele estão os executivos da empresa Jaime Palaia Sica e William Ochiulini Laviola, todos denunciados pelo MP baiano pelos crimes de fraude em licitação e corrupção ativa.

Concorrências. O relatório conclusivo da Operação Nêmesis mostra que a Julio Simões foi beneficiada no processo de licitação para a locação de 191 viaturas da Polícia Militar da Bahia. A empresa venceu a concorrência com uma proposta de R$ 32 milhões, em uma negociação que contou com o intermédio do ex-comandante da PM, coronel Antonio Jorge Ribeiro de Santana.

Segundo aponta o relatório, o grupo Julio Simões, que atua nos setores de transporte de cargas e de passageiros, coleta de lixo, seguros e comercialização de automóveis, é acusado de ter usado o mesmo expediente para faturar o contrato que mantém com a PM mineira. Aqui, a empresa venceu a licitação com uma proposta de R$ 56,7 milhões para a cessão de 831 viaturas no modelo de terceirização de frota.

Após grampear ligações telefônicas de integrantes da organização, a Polícia Civil relata, no documento, uma conversa entre o coronel Santana e o lobista Gracilio Junqueira Santos, apontado como "líder da quadrilha" e identificado pelo codinome HNI.

"Santana diz que o pessoal tem que levar a documentação porque aqui (na Bahia) é tudo mais complicado. Tem uma legislação que é muito rigorosa, devido ao Tribunal de Contas ficar pegando no pé do pessoal, porque o valor é alto", narra o documento. E complementa: "o pessoal acha que aqui no Estado é como no Rio, Minas, que faz contrato de qualquer jeito. HNI diz que segunda ou terça-feira precisa se sentar com Santana para conversar. Santana pede um tempo porque esse problema está deixando ele maluco. HNI diz que está segurando lá."

Com pelo menos 80 filiais espalhadas pelo país, o grupo Julio Simões tem um faturamento anual de R$ 1 bilhão.


Concorrências
Executivo confessa costume de “burlar”

Durante a primeira fase da Operação Nêmesis, conversas telefônicas travadas entre “colaboradores” da empresa Julio Simões na Bahia reforçam as suspeitas de fraude no contrato firmado entre a empresa paulista e a Polícia Militar de Minas.

Apontado dentro do inquérito como “o mediador” da negociata, o executivo Willian Ochiulini Laviola confessou, sem saber que era alvo da operação policial, que a Julio Simões tem o costume de “burlar” em seu favor todas as concorrências públicas que participa.

“Esse suspeito travou vários diálogos, em sua maioria referentes a processos de licitações em alguns Estados do Brasil, ocasiões em que utilizava uma linguagem codificada e pouco objetiva, levando à dedução de sua ‘contumácia’ em burlar concorrências públicas em favor da Julio Simões”, diz o trecho do relatório do setor de inteligência da Polícia Civil da Bahia.

Jogo de cena. Segundo as investigações, a fraude só prosperou por causa da ajuda de outras empresas que forjaram o credenciamento ao processo de licitação. De acordo com o relatório, as firmas sequer enviaram representantes para acompanharem o certame na modalidade pregão presencial, o que comprovaria o jogo de cena.

No processo licitatório para compra de viaturas da PM baiana foram credenciadas a LM Transportes, Serviços e Comércio Ltda. e a Ouro Verde Ltda.

“O certame foi até a décima segunda rodada de lances oferecidos pelas empresas, cujos valores variavam irrisoriamente, tendo a Julio Simões dado a última proposta, havendo um nítido ajuste de preços entre essas duas empresas para que o valor não caísse muito, ficando o valor final bem acima do que foi estipulado pela própria Polícia Militar no início do processo de compra”, diz o relatório assinado pelo delegado Jardel Peres. (EF)

Relações
PM da Bahia copiou modelo mineiro

Outro trecho do relatório conclusivo da Operação Nêmesis, que serviu de base para a denúncia formulada pelo Ministério Público da Bahia contra a empresa Julio Simões, mostra que a Polícia Militar baiana “copiou a iniciativa adotada pela Polícia Militar de Minas”.

Segundo o relatório, “o grande idealizador do projeto de aquisição parcelada com terceirização de frota” foi o tenente José Augusto Tuy Brito Oliveira. Tanto que foi encontrado no gabinete dele, dentro do Departamento de Planejamento da PM da Bahia, “uma cópia do processo de contratação da Julio Simões pelo Estado de Minas Gerais para aquisição das viaturas da Polícia Militar daquele Estado”.

De acordo com as investigações, o tenente Tuy chegou a nomear “dois oficiais do departamento para visitarem Minas Gerais a fim de estudarem a aquisição das viaturas por aquele Estado”. Sempre a mando do coronel Jorge Antonio Ribeiro de Santana.

Contatos. Em seu depoimento, Tuy confessou que manteve contatos com o executivo Jaime Palaia Sica, do grupo Julio Simões, “antes do processo licitatório”, o que reforçaria a tese de licitação direcionada em favor da empresa.

“Destaque-se que, quando fez a juntada dos seus documentos no procedimento licitatório, a empresa paulista Julio Simões apresentou atestado de capacidade técnica emitido pela Polícia Militar de Minas Gerais dando conta de que a mencionada empresa teria realizado o mesmo contrato de compra parcelada com gestão de frota de 831 viaturas”, diz trecho do relatório.

Ainda de acordo com o documento, o contrato mineiro “foi alvo de questionamentos da Comissão de Segurança da Assembleia Legislativa de Minas pelo fato de a citada empresa ter vencido a licitação com preço superior a R$ 3 milhões.” (EF)



Esquema
Lobista montou rede de laranjas e usou empresas de fachada

Para manipular o milionário processo de licitação na Bahia, a empresa Julio Simões contou com a preciosa atuação do lobista Gracilio Junqueira Santos. Ele abriu cinco empresas fantasmas na tentativa de dar fachada legal aos rumorosos negócios financiados pelo grupo paulista.

Além das empresas de fachada (Aserv Empreendimentos Comerciais, Tecno Import Comércio Representação e Serviços, Central de Negócios e Comércio, Medlinks Materiais Hospitalares e Hiperion Comércio Representações e Serviços Ltda.), Gracilio montou uma rede de laranjas para participar da concorrência.

O esquema de fraude, segundo denúncia do Ministério Público da Bahia, teve superfaturamento de R$ 9,8 milhões, o suficiente para comprar mais 65 veículos para a PM.

Relações escusas. Amigo dos integrantes do chamado “núcleo fardado” da organização criminosa, o lobista pagou propina de 3% do valor total do contrato – que é de R$ 32 milhões – para o alto escalão da PM de Salvador.

De bem com a vida, Gracilio marcava encontros com os coronéis baianos e com os executivos da Julio Simões no Shopping Salvador, segundo as fotografias que fazem parte do inquérito conclusivo.

Conforme as imagens, ele chegou a ir na casa do ex-comandante geral da PM coronel Antonio Jorge Ribeiro de Santana para negociar o pagamento das propinas.

Para o promotor Luiz Augusto de Santana, ficou claro o superfaturamento após uma simples pesquisa de preço em concessionárias de Salvador sobre o valor dos dois tipos de veículos contidos na licitação. O promotor conclui, em sua denúncia à Justiça, que foi pago um superfaturamento de R$ 65.347 por cada viatura. (EF)

Outro lado
Sem resposta. A reportagem entrou em contato com a assessoria do grupo Julio Simões em São Paulo na tentativa de agendar uma entrevista, mas até o fechamento desta edição, não obteve resposta.

Fonte: http://www.otempo.com.br/otempo/noticias/?IdEdicao=1347&IdCanal=6&IdSubCanal=&IdNoticia=115130&IdTipoNoticia=1

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